Visitar a Opéra Garnier é sempre uma experiência sensível. Lembro-me bem da primeira vez que "dei de cara" com o vistoso palácio de 1875, pois para quem chega de metrô é exatamente assim: você sobe as escadarias da estação de costas para o prédio e quando se vira, lá está ele, exuberante, impondo-se, como que esfregando beleza em nossos olhos.
Mas, nesta noite a arquitetura foi moldura diante de Rain (2001), obra da celebrada coreógrafa belga Anne Teresa de Keersmaeker, que acaba de ser inserida no repertório do ballet da Opéra. A música minimalista de Steve Reich - Music for 18 musicians (1976) - interpretada por l’Ensemble Ictus; aparece como principal fio condutor do movimento, tem-se mesmo a sensação de uma continuidade indivisível entre música e dança, que gera uma leveza tão forte que confunde as palavras. Sim, parecem dois adjetivos inconciliáveis esses que usei, aliás é sempre complicado trazer para o 'papel' o que é da ordem do sensível, mas o fato é que me impressionou o universo singelo para o qual Rain nos transporta e ao mesmo tempo, o extremo cuidado e trabalho técnico eminente, tanto na música quanto na dança.
Em mais um imbróglio ortográfico eu diria que o espetáculo começa e termina sem parar. Parece único o movimento que leva os corpos a uma tensão e exaustão somente imaginadas, pois enfim o que se exprime é também a beleza; ágil e prazeirosa como brincadeira de criança. Uma imagem que me lembra a neve, talvez por recém conhecê-la, mas é naquela brancura que reconheço a força-leve e silenciosa que vi no palco nesta noite.
Pouco me importei por estar em um lugar de visibilité réduite, ao contrário, ficar de pé me fez vibrar com o músico e me mover seguindo a dança, transformando essa noite em uma das mais especiais que vivi em Paris. Um dia pleno de belezas humanas, por dentro, por fora, do começo ao fim.

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